Perspectiva
Um blogue sobre fotografia, por Luís Afonso

Experiências Fotográficas


Nestas últimas semanas, obra do acaso ou não, chegaram ao meu conhecimento vários projectos na área da formação em fotografia de natureza em Portugal. Ainda hoje, foi anunciado um novo projecto pelo Fernando Romão, o qual aproveito para felicitar e desejar o maior sucesso. Uns mais sérios, outros menos, uns mais formativos, outros mais lúdicos, representam o sinal dos tempos no que à maturidade da democratização fotográfica diz respeito. Considero, por isso, estarmos perante um panorama dinâmico e muito activo que deve encantar todos os que, como eu, gostam de fotografia, de falar sobre ela e de viver em torno dela.

Já escrevi sobre o gosto imenso que tenho em partilhar a minha paixão por esta arte e não vos quero maçar mais sobre isso. Hoje, gostava de me colocar no papel inverso ao de formador e de partilhar convosco alguns aspectos daquilo que considero essencial encontrar num evento de formação em fotografia, quando no papel de “aluno”. Dicas gratuitas para a concorrência, dirão alguns…

Como ponto prévio gostava de partilhar convosco que, antes da minha experiência como formador, iniciada em 2010, considerava os workshops e os passeios fotográficos uma completa perda de tempo. Mais do que tudo, achava que para alguém que já fotografava há mais de 10 anos, pouco haveria a aprender ou a desfrutar. Nunca tive qualquer problema em fotografar sozinho, em sair de casa e, por essa razão, fotografar em grupo nunca me suscitou grande interesse. Não podia estar mais enganado…

Viver de perto este tipo de experiência ensinou-me que, quanto mais aprendemos, mais estudamos, mais partilhamos, mais descobrimos que nos falta um universo inteiro para usufruirmos da fotografia na sua plenitude. Cartier-Bresson costumava dizer que “as tuas primeiras 10.000 fotografias são as piores” e talvez não andasse muito longe da verdade. Isto também não quer dizer que as próximas serão melhores, mas isso é tema para outro artigo. O importante a reter é que desde aquele que comprou ontem a sua primeira câmara fotográfica, até ao amador mais avançado à procura de novas ideias, para todos há lugar num evento de formação fotográfica, saibam as entidades que os promovem saber chegar com qualidade a cada um destes públicos.

Tal como aprender a conduzir

Para quem está a dar os primeiros passos na fotografia, um workshop é um óptimo acelerador de conhecimento, não havendo substituto à altura nos meios que são colocados à disposição na biblioteca ou na internet. O saber até pode estar disponível em livros, vídeos e demais artigos online, mas a presença de um formador que esclareça, guie e partilhe experiências, é insubstituível. Por essa razão, é característica fundamental dos workshops a completa dedicação dos formadores aos alunos e a existência de uma estrutura que permita a quem aprenda um processo de assimilação sólido e coerente. Sempre me fez confusão saber que existem “formadores” que delegam noutros a componente do ensino, que fotografam nos workshops que lideram, que deixam à deriva os seus alunos e que, inclusive, pedem a estes que se desviem quando no enquadramento surge alguém que até pagou para ali estar. A culpa, como é óbvia, não é destes “formadores”: é sim de quem paga por uma formação liderada por pessoas que agem desta forma.

Num workshop, olho a componente teórica – o saber – como o mais importante. Isso e o colocar em prática no terreno – o fazer – aquilo que se aprendeu na teoria. Por tudo isto, costumo dizer aos meus alunos que as boas fotografias serão feitas longe deste espaço de aprendizagem, com calma, na interioridade das vivências fotográficas de cada um. Se está num workshop para fazer boas fotografias, então está no sítio errado: devia estar num passeio fotográfico ou noutro lado qualquer.

Como aluno, é fundamental que se façam muitas perguntas. Antes, durante e após o workshop. E é no sucesso das respostas que recebemos do formador que devemos avaliar o sucesso da nossa participação. Costumamos dizer aos nossos filhos para perguntarem sempre que têm dúvidas. Os nossos professores costumavam dizer-nos que se não temos dúvidas é porque não estudámos. Tudo isto se aplica a um workshop de fotografia: se não questionarmos, se não procurarmos inspiração, se não testarmos a capacidade de motivação do formador, então seria talvez preferível termos gasto o dinheiro num bom almoço entre amigos, numa ida ao cinema ou na compra de um bom livro. Tudo isto teria feito mais para nos tornar melhores fotógrafos do que uma presença silenciosa num workshop.

A qualidade paga-se…

Toda esta partilha de conhecimento, feita com a qualidade que exijo como aluno, tem um preço. Dois dos meus fotógrafos favoritos propõem um workshop que considero de sonho ao preço de alguns milhares de euros. Caro, dirão alguns. Em Portugal, não é difícil encontrar quem publicite workshops por pouco mais de 10 euros. A realidade é completamente diferente, é verdade, mas a formação tem um preço que merece ser respeitado, tanto para quem opera no mercado, como para o aluno que ansia receber em troca ensino de qualidade. Eu, como aluno, quando me inscrevo num workshop – ou em qualquer formação de qualquer área -, espero qualidade e dedicação. Não me interessa se pago 20, 50 ou 1000 euros, pois não sou eu que estipulo os preços. Eu apenas pago aquilo que me exigem, que estou disposto a embolsar e, no final, estarei preparado para avaliar a experiência e o retorno que obtive da formação frequentada. Aqueles que se escudam em preços baixos para fazer workshops que apenas o são no nome que ostentam seguem um caminho oposto aquele que preconizo. E isso devia constituir sinal da alerta para quem neles se inscreve. Na dúvida, façam perguntas, consultem informação pública sobre os formadores, procurem relatos de quem já frequentou. E tomem nota do número de lugares disponíveis. Se vão ter de competir pela atenção de um formador com uma dezena de colegas algo não vai funcionar bem. Tudo isto deve ser feito antes de se inscreverem.

Eu já sei tudo!

Para um iniciado, tudo é novo. Da técnica fotográfica à estética visual, inúmeros são os campos de trabalho do formador e de descoberta para o artista enquanto jovem praticante. É fácil, por essa razão, apresentar material de formação, melhor ou pior preparado, pois é natural que pequenos erros passem despercebidos. Não é também de estranhar que a oferta existente para este público nasça como cogumelos, havendo oferta para todos os gostos, em todos os formatos.

Para um amador/avançado que já domina a técnica e que procura algo diferente, a oferta já é mais reduzida. Isto porque partilhar mais do que o bê-á-bá da técnica fotográfica exige maturidade em quem forma e, acima de tudo, demanda que o formador tenha algo a dizer e o saiba fazer com inspiração e mestria. Dizer que se gosta de uma fotografia é fácil; o complicado é explicar porquê. E sim, por mais espiritual que seja a criação artística, há sempre um porquê.

Considero que o que leva um amador/avançado a procurar um evento desta natureza é algo radicalmente diferente de um iniciado. Por um lado, procura o acesso a novos lugares, a novas pessoas e, acima de tudo, a novas maneiras de ver. Os passeios fotográficos podem ser o palco privilegiado para isto. Mas temos de estar preparados para ter o formador/líder a fotografar ao nosso lado. Nos passeios fotográficos, ao contrário dos workshops, o líder, além de conduzir o grupo pela rota estabelecida, também fotografa e o tempo que tem disponível para cada um dos participantes é necessariamente reduzido. Também aqui é preciso conhecer bem o formador que temos à frente e saber aproveitar o tempo que temos com ele para fazer as perguntas certas. Também o podemos observar durante o seu trabalho, pois há também aí muito a aprender se prestarmos atenção.

Quando participo nestes passeios, procuro sempre lideres que tenham duas características fundamentais: por um lado, é importante que eu me reveja na forma como apresenta o seu trabalho, no modo como persegue a sua carreira e, acima de tudo, naquilo que tem para dizer e como o diz. Por outro lado, é fundamental que conheça os locais escolhidos como ninguém e que possa inspirar quem lá está através desse mesmo conhecimento.

Em todas as facetas humanas, há sempre alguém que pensa já saber tudo. E não há nada de mais perigoso do que ter a impressão que se sabe tudo. Na fotografia, também existem pessoas que já sabem quando se fotografa, como se fotografa, que equipamento usar em cada situação. O importante para o sucesso de um evento de formação fotográfica para este tipo de pessoas é oferecer uma perspectiva para a qual não estão habituados a olhar. Ou seja, coloca-los na pele de iniciados, numa redescoberta verdadeiramente luminosa. Mostrar-lhes, por exemplo, que embora esteja a chover, é possível fazer fotografias que nunca vão esquecer, mostrar-lhes que embora esteja um pôr-do-sol vermelho no céu a melhor opção talvez passe por apontar a câmara para baixo. Como eu costumo dizer, quando me inscrevo num passeio fotográfico estou à espera de lá sair com a sensação que descobri algo novo, seja com o líder, seja com as pessoas que me acompanham.

Para se fazer isto, não basta ao líder/formador ser um excelente fotógrafo. Por vezes, isso nem é necessário. Importante mesmo é a sua capacidade de inspirar, de nos fazer sair da nossa zona de conforto, de nos querer marcar com a sua presença. Só assim conseguirá fazer-nos sair de casa e daquilo que fotografamos todos os dias.

Círculo

Termino com a referência a algo que me continua a deslumbrar no fim de cada experiência em que participo: o facto da dinâmica de grupo produzir resultados tão profundos em cada um e como a espiritualidade desse círculo raramente é interrompida pela vontade egoísta de cada participante. O sucesso de um evento deste tipo reside muito na capacidade dos formadores saberem lidar com a dinâmica de grupo e com as particularidades de cada um. Isso nota-se nas primeiras horas de cada workshop ou passeio e é aí que deve ser investido grande parte da dedicação que quem está à frente deste tipo de acção. Mas ao aluno serve também de conforto e de elemento atractivo na inscrição neste tipo de actividade. Saber que as suas expectativas e ânsias não são muito diferentes das dos restantes: vontade de aprender, de querer ser melhor fotógrafo e, acima de tudo, de passar um bom tempo à volta de algo que nos une a todos, alunos e professores.

As pontes são elementos tantas vezes fotografados. Que cada líder saiba ser a ponte pela qual os seus alunos acedem aquilo que de mais luminoso tem para revelar. Mas que consiga também perceber quando é tempo de as desmoronar de modo a inspirar esses mesmos alunos a criar as suas próprias travessias. E que cada aluno procure, como exigência, dar cada passo que constitui essa viagem. Nunca se esqueçam: é o aluno que está a pagar para aprender e nunca o contrário!

Índex de Entidades/Fotógrafos

Referência

Fotonature (Luís Afonso, Miguel Claro e Nuno Luís)
Green Captures (Francisco Calado, Luís Quinta, Ricardo Guerreiro, Rúben Neves, entre outros)

Carlos Rio
Fernando Romão
Gonçalo Lemos
João Cosme
João Nunes da Silva
Joel Santos
Pedro Martins

Restantes, entre novos e menos novos

António Sá
Carlos Dias
Diogo Oliveira
Green Trekker
Pedro Ribeiro
Photo Details Workshops
Photonatour

Nota: Esta é uma lista não exaustiva das entidades – e os fotógrafos que lhes dão rosto – ligadas à formação da fotografia de natureza. Estes projectos realizam workshops e passeios fotográficos em Portugal. Excluem-se as entidades mais académicas que realizam cursos, as entidades mais orientadas para viagens lá fora e os fotógrafos que, operando em Portugal, não têm presença pública para além das redes sociais. Como é óbvio, não tenho conhecimento de todos pelo que se quiserem dar a conhecer podem comentar este artigo ou contactar-me de outra forma. A escolha das entidades de referência reflecte apenas a minha opinião pessoal.

2 Comentários

  •    Responder

    A minha experiência pessoal em workshops apenas se resume a 2 workshops realizados na vossa Foto-Nature, não posso por isso opinar sobre o modo como outras entidades realizam as suas formações, posso no entanto dar a minha opinião sobre a minha experiência com base naquilo que referes neste artigo. É realmente importante aproveitar os wks para aprender com o formador mas também muito com os outros fotógrafos, e principalmente estarmos recetivos a experimentar novos enquadramentos ou novas técnicas porque é para isso que servem estes wks e também já agora para conhecer novos spots! Quanto ao formador aquilo que mais me motiva e me faz aumentar os meus indices de aprendizagem é o modo como este consegue improvisar quando por uma contrariedade não é possivel seguir o plano que estava previamente delineado para a formação, bem como a capacidade deste em sugerir enquadramentos que não seriam os mais obvios para nós. Penso por isso que participar em wks com um grupo limitado de alunos e com um bom formador é muito importante para evoluirmos na fotografia mas também acho que não será nos wks o local ideal para fazermos as nossas melhores fotos.

  •    Responder

    Desconhecia este artigo, Luís. Foi a Elsa F. que me avisou.
    Não posso deixar de expressar aqui que fico muito contente e honrado por me referenciares, a mim em particular e a outros em geral, facto muito raro neste pequeno canto do planeta.
    Boa continuação, Luís.
    Abraço.
    Carlos
    ps- TENHO de espreitar e acompanhar este blog…

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